No trabalho, foram analisados rótulos de 9.856 alimentos e bebidas, constatando que um quinto dos itens não continha qualquer aditivo alimentar, enquanto um quarto apresentava seis ou mais em sua formulação. Além disso, verificou-se a existĂȘncia de agrupamentos de aditivos que se repetiam em diferentes grupos de alimentos, especialmente nos ultraprocessados. Mesmo em situação de regularidade, foi possĂvel comprovar a insuficiĂȘncia de informações sobre os ingredientes na embalagem.
De acordo com a norma brasileira, não é necessĂĄrio declarar o nome de cada substância que compõe o aroma, sendo suficiente identificar sua classificação como "natural", "idĂȘntico ao natural" ou "artificial". Porém, em diversos casos, encontrou-se apenas a menção a "aromatizantes" ou "aromas" na descrição do item, o que sugere que hĂĄ nesses produtos uma mistura de aditivos não identificados nem tipificados.
A professora associada do Departamento de Nutrição Aplicada e do Programa de Pós-Graduação em Alimentação, Nutrição e SaĂșde do Instituto de Nutrição da Uerj, Daniela Canella, conta que alguns alimentos não contĂȘm aditivos alimentares na lista de ingredientes, mas são compostos por alimentos que tipicamente os contĂȘm.
"Ao ingerir esse produto, o indivĂduo estĂĄ exposto a uma combinação de aditivos sem saber. Isso acontece com frequĂȘncia em refeições ou lanches prontos: pizza, lasanhas, massas recheadas, sanduĂches e salgados, entre outros", afirmou Daniela, orientadora do estudo.
"Do ponto de vista da informação ao consumidor, a embalagem não informa suficientemente para que as pessoas possam tomar decisões. O ideal seria que na lista de ingredientes da pizza congelada, quando aparece, por exemplo, o item presunto, abrir um parĂȘnteses para incluir todos os componentes do presunto", acrescentou a professora.
Os aditivos são geralmente utilizados em alimentos e bebidas ultraprocessados e são adicionados intencionalmente durante a fabricação, processamento, preparação, tratamento, embalagem, armazenagem, transporte ou manipulação, sem o propósito de nutrir, mas visando a modificar as caracterĂsticas fĂsicas, quĂmicas, biológicas ou sensoriais do produto.
"Os ultraprocessados são formulações industriais feitas com pouco ou nenhum alimento in natura ou minimamente processado. Eles precisam dos aditivos para que fiquem palatĂĄveis e para durar nas prateleiras", explicou a pesquisadora.
No Brasil, o uso desses aditivos é regulado pela AgĂȘncia Nacional de Vigilância SanitĂĄria (Anvisa), que se fundamenta também em critérios apoiados por regulamentações regionais, como as do Mercosul, e em sugestões emitidas em âmbito mundial por comitĂȘs de especialistas da Organização Mundial de SaĂșde e da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura. Porém, segundo o estudo, apesar de diversos aditivos alimentares serem autorizados, seus efeitos sobre a saĂșde do consumidor vĂȘm sendo questionados por especialistas.
"Questionar esses efeitos torna-se ainda mais importante quando se nota uma variação na condição de consumo dessas substâncias, pois, na prĂĄtica, elas não são consumidas isoladamente, mas combinadas a outros aditivos, seja em um mesmo alimento ou em alimentos consumidos ao longo de um dia. Sendo assim, esse problema deve ser considerado crĂtico em um cenĂĄrio de crescimento da ingestão de alimentos e bebidas ultraprocessados", explicou a professora.
De acordo com a pesquisadora, os ultraprocessados estão relacionados a uma série de doenças crônicas, como obesidade, doença cardiovascular, diabetes, câncer, doença inflamatória intestinal.
"A minha recomendação é a mesma do Guia Alimentar para a População Brasileira do Ministério da SaĂșde: evite o consumo de ultraprocessados, prefira os alimentos in natura e minimamente processados e analise a lista de ingredientes".
O artigo sobre a pesquisa foi publicado em fevereiro na Revista de SaĂșde PĂșblica, periódico cientĂfico editado pela Universidade de São Paulo (USP). O trabalho foi iniciado no âmbito do doutorado da aluna de Nutrição da Uerj Vanessa Montera e, na sequĂȘncia, surgiu a parceria com o Idec que estava conduzindo pesquisa sobre rotulagem de alimentos e construindo um banco de dados extenso com mais de 10 mil produtos encontrados em supermercados.
Fonte: AgĂȘncia Brasil